. DE VISTA
Qual seria o segredo para as novas gerações viverem bem? Se você fizer essa pergunta, a primeira resposta que virá à cabeça da maioria das pessoas será algo ligado à tecnologia da informação.
Mas porque essa expressão carregada de símbolos e paradoxos tem se tornado tão essencial para o dia-a-dia do homem moderno? Essa resposta é, provavelmente, o centro da crise social (e porque não existencial) que vivemos hoje. O sistema político atual – a tão especulada globalização – e a lógica capitalista colaboram incentivando o consumo, o egocentrismo, o narcisismo. Aliado a isso, temos o cenário de avalanche tecnológica que nos desatualiza a cada novo minuto, trazendo novidades que facilitam tanto a vida que até mesmo o conhecimento é incorporado por equipamentos, cada vez mais sedutores e potentes. O conhecimento humano está aumentando explosivamente e, coletivamente, o mundo está ficando mais inteligente. Individualmente, o homem se depara com um grau de exigência cada vez maior, em muitos casos passa a dar menos valor às relações afetivas, necessita dominar a informação, coloca prioridade do ter sobre o ser e despreocupa-se com a dignidade humana do próximo e com o meio ambiente.
Totalmente inseridas neste contexto, e não mais poupadas de qualquer espécie de degradação humana, estão surgindo as novas gerações. Crianças e adolescentes de hoje vêem, vivem e se misturam a essa onda, são seduzidos por esse universo cada vez mais cedo e com maior facilidade. A mídia, normalmente agressiva, se encarrega de incutir nessas cabecinhas, já não tão inocentes, valores sempre muito ligados às tecnologias atuais e o modo de vida dessas crianças fica perigosamente dependente das facilidades que essa revolução informatizada traz.
Embora os lados positivos dessa realidade sejam inúmeros, são sempre individuais. Uma prova disso é a exclusão digital que vivem inúmeras pessoas, independente de países ou fronteiras. Comunidades inteiras são completamente privadas de qualquer contato com esse mundo novo e, apesar de parecerem bem assim, estão à margem da nova ordem mundial, o que as transforma em itens dispensáveis, seres sem importância no ciclo individualista que traçamos como ideal de vida já para nossas crianças, deixando-as sem escolha, sujeitas a essa realidade.
Em Brasília, acontece um lançamento que vem a calhar para explicar esse contexto. Uma escola para adolescentes de classe média alta, a mais tradicional da cidade, está inaugurando seu serviço de ensino à distância, o EAD, utilizando para isso a Internet. A idéia dos coordenadores do projeto é ótima, segue fielmente o modelo já aplicado em vários outros lugares: possibilitar que uma criança tenha aulas alternativas, não-presenciais, mas com exercícios, conteúdo e até mesmo plano de curso. O aluno é matriculado se quiser e terá a facilidade de se preparar para o futuro no conforto do seu quarto, acessando seu computador. Mas como fazer uma criança acostumada com esse comportamento entender que o convívio com outras crianças é muito mais importante do que quase tudo numa escola? Como convencê-la de que o hábito de folhear um livro acrescentará na sua formação cultural positivamente? Será que esse aluno estará mesmo se preparando para o futuro?
A pergunta mais freqüente é um ponto crítico dessa nova filosofia: seria esse modelo capaz de substituir a educação convencional, as escolas, professoras, a leitura? Tomara que não. Sendo mais clara, é inegável o dano que essa cultura digital está causando nas novas gerações, é totalmente perceptível que muitas crianças estão se tornando seres mais egoístas, tímidos, fechados em seu mundo de jogos e salas de bate papo. Criam novas linguagens, novos costumes, fazem das suas tribos grupos tão exclusivos, impossíveis de penetrar. E, a não ser que isso não passe de uma fase, o futuro delas desenha-se complicado, provavelmente serão adultos cheios de problemas pessoais e afetivos, workaholics assumidos e pais neuróticos. Assim como a liberação sexual nos anos 70 causou danos irreversíveis às gerações da época, é preciso cuidar para que essa tendência incontrolável para a comunicação não seja tão avassaladora como esperam os mais pessimistas.
Também em Brasília, acontece um exemplo positivo da globalização influenciando comportamentos: a Universidade de Brasília (UnB) conhecida nacionalmente por sua excelência, inaugurou esse ano a agência AAI, Assessoria de Assuntos Internacionais. Trata-se de um órgão interno que se encarrega de manter contato com outras universidades no mundo e viabiliza o intercâmbio cultural de alunos de graduação e mestrado. Os interessados passam por uma série de entrevistas e avaliações e, se aprovados, sua viagem é totalmente custeada pelo governo. São ao todo 29 instituições associadas e os alunos espalhados por outros quatro continentes já somam quase 300. A informação em forma de cultura possibilita para esses jovens experiências únicas e eles trarão para o país seu conhecimento em forma de profissão. É um bom exemplo que nos ajuda a perceber que não é o excesso de informação e de tecnologia que impede o crescimento humano, mas sim, como essas potencialidades estão sendo utilizadas.
O segredo para as novas gerações então, provavelmente está na família, na tradição que ela nos remete. Essa corrida digital e cultural é necessária, também não se pode querer que uma criança se torne alheia a sua realidade, seria muito mais injusto. Todas as portas abertas por essa nova era representam mundo novos e muito interessantes, mas também perigosos, então se deve ter cuidado. Complementando a idéia de família, o segredo pode estar também no equilíbrio, não se pode deixar de impor limites a uma criança ou adolescente. Algumas regras simples e tão antigas quanto esse mundo ainda são fundamentais e ajudam a entender que a maior necessidade frente a esse furacão social e cultural é o cuidado em preservar e conservar a infância, não esperando das novas gerações futuros Bill Gates, Michael Jordans, Ronaldinhos, Lucianos Huck, e por aí vai. Devemos cultivar, (fique claro) sem pretensões, pequenos Gandhis, Mandellas, Betinhos.
A tecnologia pode entrar em retrocesso e a humanidade não vai acabar por isso. O que não pode acontecer é o ser humano entrar em retrocesso, é o abandono de culturas antigas, filosóficas e éticas, conhecimentos necessários ao processo de evolução que nunca cessa.