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quinta-feira, setembro 07, 2006

GLOBALIZAÇÃO - Mocinhos e bandidos na era da Internet

Por Rafael Aguiar

Um acontecimento recente pôs em xeque a sensação de liberdade na circulação de informações usufruída pelos internautas em todo o globo. O jornal The New York Times, em sua versão online, bloqueou o acesso a uma matéria que divagava sobre possíveis ações terroristas em vôos Londres - EUA para todo e qualquer cidadão britânico. A tal sensação de liberdade é restrita cada vez mais a uma ferramenta que promete ser a dor-de-cabeça dos websites de grandes empresas: os Blogs. Um Blog é uma página – quase sempre gratuita – da web que pode ser mantida tanto por jornalistas quanto por leigos, tanto por equipes numerosas quanto por um usuário. Blogs podem até mentir, mas como raramente estão envolvidos em alguma questão capitalista, servem mais como censura da grande mídia do que como distorção dos fatos.

Quanto ao bloqueio do principal periódico do "centro do mundo", New York, ele faz sentido? Que interesses escusos estariam por trás da medida? Segundo o próprio site do NYT tudo não passa de uma manobra para fugir de processos da Corte Inglesa, isso porque o emissor de alguma notícia que prejudique réus de julgamentos em curso (no caso os suspeitos de articulação de atividade terrorista) estará sujeito a sanções. Pelo menos até hoje nenhuma agência de notícias ou veículo da imprensa de fora do Reino Unido foram punidos, mas – como prevenção – os americanos preferiram vedar o acesso a informações que pudessem "mudar os rumos dos julgamentos". Claro que não impede que os indivíduos da nação européia entrem em contato com fontes norte-americanas visando à obtenção do artigo, no entanto "era o máximo que se podia fazer nessa situação, o que nos livra de qualquer problema com os tribunais ingleses", garante um dos advogados do The Times.

Agindo para evitar ser processado e abdicando dos clicks e pageviews de milhares de leitores, o – não só o maior de New York – terceiro jornal em número de exemplares dos Estados Unidos não estaria incorrendo em grave erro, ao mesmo tempo ético e econômico? Se perdeu leitores ou dinheiro, a escolha foi deles próprios. Fato é que foi o primeiro exemplo de semelhante postura restritiva no ciberespaço, com exceção das práticas na República Democrática da China, que, paradoxalmente, a despeito do nome, restringe todo e qualquer tipo de informação subversiva (leia-se "contra o governo") que circule em qualquer página. Além disso, os editores não previram o chamado fator curiosidade: quanto mais um ser humano é proibido de um ato, mais ele buscará cometê-lo. Quem conhece o Gênesis vai entender. No momento em que os britânicos descobriram que não era um inocente defeito de link quebrado, a história circulou rapidamente e despertou o interesse geral. O fato de os administradores do site não terem redirecionado os usuários ingleses a uma página explicativa acerca da possibilidade do NYT sofrer um processo é ruborizante, afinal, como prestadores de serviços, eles deveriam dar satisfações aos clientes.

Diante de tanta intransigência, é de se pensar se a world wide web ainda é a mesma. Se quem navega pode confiar no que lê, onde quer que esteja lendo. Apesar de ter sido um caso isolado, nada impede que atitudes intempestivas como essa se multipliquem partindo das redações mais conceituadas e se alastrando rapidamente para as de médio e pequeno porte. Há alguma fonte de notícias imune ao furacão? Tudo indica que os blogueiros, os tais donos dos independentes Blogs, têm a resposta. Quando o Blog é feito por uma pessoa que não lucra com seu trabalho – ou cuja remuneração em nada influi no que põe no ar – as chances de se estar diante de informações isentas aumentam. Isso porque, apesar de as informações não passarem por algum tipo de censura ou fiscalização (nem é possível saber se o blogueiro se dedicou a checar a veracidade do conteúdo), é um alívio saber que nada ali obedece a interesses corporativos. No máximo a paixões pessoais, e ainda assim são tantos os Blogs a consultar que pelo método comparativo o leitor atento fatalmente elucidará a questão. Na prática, significa que por mais que o New York Times solde a "porta da liberdade de circulação do conhecimento" para um país inteiro seus internautas poderão rastrear algo idêntico ou próximo ao "proibido" (a maçã do livro do Gênesis) entre Blogs estrangeiros. Foi quebrado o monopólio da palavra. Qualquer um recebe e produz conteúdo na nova era da Comunicação.

O poder dos Blogs não afeta somente a mídia propriamente cibernética ou a impressa (o NYT é os dois), mas o meio mais popular de propagação de notícias: a televisão. A CNN, líder absoluta no ramo dos canais noticiosos 24 horas até o início da década de 90, hoje sofre a concorrência de redes como FOX News, Bloomberg e Al Jazira. Obviamente, nacionalizando o raciocínio, a soberania Global encontra pedras no sapato aqui e acolá. Na última entrevista do casal William Bonner e Fátima Bernardes, ao vivo no Jornal Nacional, ao presidente e candidato à reeleição Lula, notava-se que havia um predomínio de perguntas sobre a corrupção na gestão do PT, e elas não eram feitas do modo como deveriam. Ao menos foi essa a opinião mais freqüente na Internet já minutos depois do fechamento do programa. E de onde partia? Dos Blogs. Se eles são incapazes de projetar seus debates para toda a população, devido ao alto custo de um computador em termos tupiniquins, ao menos incomodam os blocos detentores da informação (não apenas os Marinho). E a vara com que andam cutucando tantas onças não é curta.

A perfeição não pode ser alcançada. A fiscalização e a emissão de informações por parte dos blogueiros devem estar sempre em aprimoramento. Sabe-se que é uma guerra, senão injusta, dificultosa destes contra os conglomerados de mídia planeta afora. Contudo, como tem de ser travada de qualquer maneira, por que não dar crédito a essa ferramenta relativamente recente do espaço virtual? A esperança numa imprensa mais transparente reside na horda de Blogs que vem tomando cada vez mais o tempo online do leitor.

A matéria citada denunciando a estranha prática do New York Times está na Reuters ( www.reuters.com.br )

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