Horário de Brasília

terça-feira, novembro 28, 2006

CIDADE VERMELHA - Brasiliense, forte como o cerrado

Por Patrícia Leite

Noite dessas abriu-se uma enorme discussão sobre o que é ser brasiliense. Os mais apocalípticos diziam que ser brasiliense era conviver entre os abutres do poder sem virar carniça. Era uma espécie de engajamento ecológico. Conviver entre cobras, ratos e outros peçonhentos e conter os desejos homicidas que estes “animaizinhos de pequeno porte” — ou seria de grande porte? Enfim, — incitam a libertar. Integrados —bem mais otimistas — diziam que o grande barato de estar perto do coração político nacional era ser confundido com “gente que tem grana” — poder.

Em janeiro, servidores públicos, estudantes, deputados, senadores etc. saem de férias, geralmente rumo ao litoral — candangos, com os filhos e netos voltam à terra natal para visitar parentes — para quem não sabe, candangos são os primeiros migrantes que vieram para Brasília na década de 60 e que erroneamente são chamados de brasilienses. Estes primeiros trabalhadores brasiliensemente chamados de piotários — não construíram grandes patrimônios —, tornam-se celebridades ao chegar às origens. Pessoas de outras localidades acham que candangos são marajás, vizinhos do presidente do Congresso Nacional e que tomam, diariamente, sorvete na mesma sorveteria que a primeira-dama, Marisa Letícia.

Apocalípticos não perdiam uma deixa e atacavam: Brasília não tem mar e todo início de ano fica mais deserta que o Saara, uma paz de latejar. E a defesa contra-atacava: na verdade, não ter praia é muito bom, imagine a cidade lotada de turistas, preços sobem, estresse. É melhor não ter praia, pegar o camelo — bicicleta —, juntar amigos — brasilienses andam em tribos —, visitar cachoeiras e trilhas, acampar, fazer fogueira, e no primeiro sábado de lua cheia descer para esplanada e tocar violão.

Apocalípticos, em tom de escárnio, diziam: detestamos a frieza cinza de tanto concreto. Integrados respondiam: em que lugar do mundo você vai tropeçar com a colorida arte — mais de 300 obras — de Athos Bulcão? Um museu a céu aberto. E, por falar em céu... Em que outro lugar há um por do sol tão lindo e cheio de matizes? Isto sem falar na diversidade cultural das pessoas, deste povo tão multifacetado. Apocalípticos se rendiam e diziam: não há lugar tão miscigenado, de povo tão rico. O brasiliense é valente — tem a força do cerrado.

Horas de discussão. Conversas circulares não chegavam a lugar comum. O dia amanheceu. Integrados disseram: Que tal um café no aeroporto? Afinal, ser brasiliense é comer bem, é ter retórica, é terminar uma rodada de contenda acompanhada de chocolate quente, pão de queijo, sanduíche e ansioso para começar a próxima discussão. Apocalípticos em uníssono: só se for agora.

3 Comments:

  • Bom texto! Aspectos bem peculiares mesmo!

    By Anonymous Anônimo, at terça-feira, 28 novembro, 2006  

  • Você escreve bem. Uma exceção aqui.

    By Anonymous Anônimo, at sexta-feira, 01 dezembro, 2006  

  • Esses anônimos talvez sejam a grande "pérola" do blogg. rsrsrsrs Falam tanta besteira, só para provocar. E no fim das contas vocês ainda terão que agradecê-los, por contribuirem ainda mais com o crescimento de cada um dos jornalistas que se dedicam a este canal.
    Me senti sentada à mesa de um café desses que há em Brasília, como se fizesse parte da história.

    Mas, será que você poderia me esclarecer uma dúvida?
    Bjos saudosos!!!

    By Anonymous Anônimo, at terça-feira, 12 dezembro, 2006  

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