Horário de Brasília

sexta-feira, agosto 18, 2006

CRÔNICA - Mentes Desocupadas

Por Peu Lucena

Dia desses riram quando insinuei que os estudantes de um certo curso tinham as “mentes desocupadas”. Tenho pra mim que as mentes, no momento de tal afirmação, estavam mais desocupadas do que nunca. Não houve indignação, tampouco indagação. Teve sim, um riso morto. Morto no sentido mais cadavérico da palavra.

O que acontece é que os nossos universitários não fazem o curso. Eles são feitos pelo curso. Recebem passivamente toda aquela massa obesa de conteúdo sem a menor preocupação em digeri-la. Esquentam cadeira por um período médio de quatro horas e levantam-se delas com um prazeroso sentimento de dever cumprido, como se estivessem se esgotado ali, naquele exato momento, todas as possibilidades de crescimento intelectual.

Até mesmo nas universidades federais, palco constante da iniciativa e o engajamento, a coisa não anda muito boa. Quem antes encabeçava movimentos estudantis agora chama de loucos e desocupados os pobres remanescentes de um ideal plausível. Nas particulares a situação beira o bizarro! É como entrar em uma granja (quem já o fez sabe do que estou falando). Todos aqueles frangos iguais, formando uma massa amarela e homogênea que não faz nada, não exige nada. Gastam o curto tempo que lhes restam apenas no passivo exercício de absorção, pura e simplesmente. Uns e outros, com esforços sobrenaturais, se armam da iniciativa e do engajamento e buscam algo mais, buscam experiências, buscam fazer o curso. Esses recebem dos frangos o carinhoso apelido de “porras-loucas”.

Para reconhecer um desocupado é muito simples. Faça o teste. Pronuncie o termo: CONCURSO PÚBLICO. É infalível, os olhos brilham, as pernas tremem, eles suam frio. É perceptível a metamorfose facial que sofrem. Essa é a solução para todos os problemas de um desocupado, ser concursado! Isso pula uma série de etapas chatas. Ter uma idéia, montar uma equipe, investir em um sonho, ter o próprio negócio, fazer o que gosta, ter tesão nos projetos. Pra que? Se temos o nosso seguro, constante, e entediante emprego público? Isso não é uma regra, é claro, mas é com isso que uma “mente desocupada” sonha.

O processo todo ocorre por que os molóides da educação fomentam a falta de iniciativa, e essa, por sua vez, cria com mãos de ferro nossos ingênuos frangos. E assim pintamos o quadro surreal do ensino universitário no Brasil, salvo raras exceções.

Não sei por que ainda ocupo minha mente com essas “mentes desocupadas”.

1 Comments:

  • Exuberante é pouco! Sabe aquela euforia que vem de dentro, começa no estômago e termina com um sorriso sarcástico? Aquele desejo de "eu ter escrito isso"?!? Pois é. Já me propus várias vezes a comentar a passividade na minha sala mas jamais conseguiria algo tão polido e metafórico - não agüento. O artigo teria mais (sic)'s e menções diretas do que tudo. Minha vontade de divagar acerca de cada frase é enorme. Devido a limitações de espaço e falhas na minha memória, "filtrei" (ou a "divina providência" me filtrou) muitos, porém aqui vão:

    . Os tais frangos não imaginam como fazer as séries elementares mal se reflete lá na frente;

    . Eu apenas leio e escrevo bastante. Não me acho CDF. Adicione ao fato de eu ser alguém participativo minha miopia. Pronto! Caem de pau. Alguns educadamente, a maioria ou enojados ou invejosos (confesso que o segundo é menos grave, não obstante eles nada fazem para suprir essa lacuna entre eu e eles), entretanto. Meu apelido lá é Chico Xavier só porque eu escrevo bastante nas provas e dizem que eu psicografo. Não, eles que escrevem pouco demais. Vou chamá-los de Lula's. Sem contar que fui eleito o representante no semestre de calouro só por causa da minha cara. Eu dava avisos na frente da sala mas não tenho a maior desenvoltura do planeta, sabe como é, então neste semestre parece que revogaram a emenda da reeleição, sem ao menos agradecer as "realizações do mandato" (com exceção de uma garota)...

    . O mesmo é válido para as redações em que estagiei. Os caras da Católica (de semestres mais para a graduação que para o ingresso na faculdade, diga-se de passagem) tinham preguiça de fazer uma tripa. Preferiam falar ao telefone.

    Minha sala não faz nada. Se fosse um organismo, teria morrido assim do parto porque nada lá é feito sinergicamente, é tudo descoordenado, cada um na sua. Lamentável, e você viu pelo número de papéis que voltaram a sua mão preenchidos: se não me engano o meu e o da Priscila (aliás, teve outra que não pôde devolver, faltou falar!). Que empolgação massiva para escreverem para o Blog, ã? Aliás, a minha fama de CDF se potencializou no momento em que, já no 1º dia de aula, ao ser interrogado pela professora, disse que tinha um Blog que falava "um pouco de tudo". Aterrorizante pensar que esse necrotério de massas cinzentas junto terá 30 vezes mais peso que eu no dia 1º de Outubro...

    Odeio este país. O pior é que você errou num detalhe: não contentes em freqüentar aulas de duração mínima e não estudar um pingo em casa, os frangos calculam meticulosamente para terminar o semestre com 16 faltas nas cinco disciplinas que cursam. O orgulho das mamães!

    By Anonymous Anônimo, at terça-feira, 22 agosto, 2006  

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